Estratégias de Precificação: Teorias, Práticas e a Construção de Valor Sustentável

01 – Introdução à Precificação no Mix de Marketing

“A precificação é o momento da verdade — todo o marketing se concentra na decisão de precificação.” (Corey, 1992) Esta citação do professor E. Raymond Corey, da Harvard Business School, ressoa com a realidade das empresas modernas e destaca a importância da precificação na estratégia de marketing. Ao contrário do que muitos pensam, a precificação não é apenas um reflexo de custos ou um ato isolado dentro da gestão de produtos e serviços, mas sim uma das ferramentas mais poderosas para gerar valor, criar percepção e sustentar a competitividade da marca no mercado.

No tradicional mix de marketing, composto por Produto, Praça, Promoção e Preço, o Preço é o único elemento capaz de afetar simultaneamente tanto a atração quanto a retenção do cliente. Ao mesmo tempo em que pode atrair consumidores por meio de uma percepção de valor, um preço mal posicionado pode afastar esses mesmos clientes, prejudicando a viabilidade de vendas. Essa dualidade torna o preço uma agenda retrativa: o consumidor não é atraído diretamente pelo preço, mas pela proposta de valor do produto; no entanto, é pela estratégia de precificação que a venda é concluída ou abortada.

Por exemplo, suponhamos que um consumidor receba uma oferta de um barco por R$ 50 mil, o consumidor provavelmente se afastaria, mesmo que o preço esteja mais de 10 vezes abaixo de sua estimativa de mercado. Contudo, ao apresentar um segundo anúncio de uma BMW no mesmo valor, a percepção do consumidor mudaria completamente, despertando seu interesse, mesmo com um desconto menor do que o aplicado ao barco. Isso ilustra que não é o preço em si que atrai, mas o produto em si que carrega o papel de despertar o interesse do consumidor e, o preço atua no valor percebido do produto que está sendo ofertado. Portanto, a estratégia de precificação desempenha um papel fundamental não só na atração inicial, mas também na fidelização do cliente, pois uma precificação inadequada pode, de fato, “expulsar” o consumidor.

Neste artigo, exploraremos as teorias e práticas de precificação, com foco em como a precificação estratégica pode ser utilizada para criar valor sustentável para empresas, baseando-nos em três obras fundamentais: The Strategy and Tactics of Pricing de Thomas T. Nagle e Georg Müller, The Oxford Handbook of Pricing Management editado por Özalp Özer e Robert Phillips, e o capítulo 16 de Administração de Marketing de Philip Kotler e Kevin Keller. A partir disso, discutiremos as estratégias mais robustas para determinar preços, avaliando não só as abordagens tradicionais, mas também apresentando métodos mais avançados para uma gestão eficaz de preços.

02 – O que é Precificação e qual seu papel na relação comercial de seu negócio

A precificação é mais do que uma simples prática contábil ou financeira; ela é, na verdade, uma ferramenta estratégica crucial para qualquer organização que busque sucesso a longo prazo. De acordo com Kotler e Keller (2018), a precificação é o processo de definir o valor de um produto ou serviço de acordo com o mercado-alvo, tendo como objetivo maximizar a margem de lucro, a competitividade e a percepção de valor. No entanto, a definição do preço não ocorre de forma isolada, mas deve ser alinhada com a proposta de valor, os custos de produção, os objetivos estratégicos da empresa e, claro, as condições do mercado e a sensibilidade do consumidor ao preço.

No contexto comercial, a precificação desempenha um papel vital na formação da relação entre a empresa e seus clientes. Ao contrário do que muitos acreditam, o preço não é apenas um fator de decisão isolado para o consumidor, mas sim um reflexo do valor percebido. A precificação adequada comunica, de forma eficaz, a percepção de valor que a marca ou o produto possui no mercado. Quando a empresa define um preço, está, na realidade, dizendo ao cliente o quanto aquele produto ou serviço é importante, útil ou desejável. Esse valor é muitas vezes mais emocional do que racional, e o preço pode ser um indicativo de qualidade, status ou prestígio, como visto no caso da BMW e do barco anteriormente discutido.

De forma geral, o preço tem o poder de influenciar diretamente a demanda, a competitividade e a lucratividade de um negócio. A teoria econômica, como mencionado em obras como The Strategy and Tactics of Pricing (Nagle e Müller, 2018), sugere que as decisões de precificação devem ser tomadas com base não apenas nos custos internos, mas também nas condições externas do mercado e nas expectativas do consumidor. Isso implica que a precificação não pode ser vista como uma decisão única, mas como parte de um processo contínuo de adaptação às mudanças de mercado, comportamentos de compra e movimentos concorrenciais.

Em um mercado dinâmico, onde as necessidades e desejos dos consumidores estão em constante evolução, a precificação precisa ser flexível, adaptativa e estrategicamente alinhada com o posicionamento da marca. Além disso, a precificação deve ser integrada com as outras decisões do mix de marketing, como a distribuição e a promoção, para garantir uma abordagem coesa que atenda às expectativas do mercado enquanto maximiza os resultados financeiros da empresa.

Assim, a precificação não é apenas um “número” — ela é um reflexo da estratégia de valor da empresa, da percepção do consumidor e da dinâmica do mercado. É uma ferramenta que, quando usada corretamente, pode gerar crescimento sustentável, diferenciação competitiva e fidelização do cliente.

03 – Crítica aos Paradigmas Tradicionais de Precificação

Como já vimos, a precificação é uma das decisões mais críticas que uma empresa pode tomar, pois ela não apenas afeta a competitividade da marca, mas também o desempenho financeiro a longo prazo. No entanto, muitas organizações ainda adotam práticas equivocadas de precificação, que muitas vezes podem comprometer tanto a percepção do valor por parte do consumidor quanto a rentabilidade da empresa. A aplicação de métodos tradicionais e simplistas, como a precificação por markup ou a orientada exclusivamente pelo cliente, pode resultar em um preço desajustado, que ou expulsa o consumidor ou deixa de gerar os lucros necessários para manter a empresa viável no mercado.

Essas práticas muitas vezes falham em refletir de forma eficaz o real valor do produto ou serviço oferecido e podem levar a sérios prejuízos. Uma estratégia de precificação mal elaborada pode resultar em vendas abaixo da expectativa ou até mesmo na alienação de clientes, que percebem os preços como excessivos ou incoerentes com a proposta de valor apresentada. Em mercados saturados, onde a diferenciação entre produtos e serviços é reduzida, uma estratégia inadequada de precificação pode, ainda, gerar uma guerra de preços que destrói margens de lucro e prejudica a sustentabilidade do negócio. No entanto, o erro mais grave reside no fato de que, em muitos casos, as empresas não percebem que a precificação mal aplicada pode ser tão prejudicial quanto um produto mal posicionado no mercado.

Agora vamos adentrar em algumas dessas práticas equivocadas de precificação.

03.1 – Precificação por Markup (Cost-plus Pricing)

A precificação por markup, ou cost-plus pricing, é uma das estratégias mais comuns no mercado, porém, também uma das mais problemáticas. Essa prática consiste em adicionar uma margem de lucro fixada ao custo médio total de produção de um produto, sem considerar o valor percebido pelo consumidor ou as condições de mercado. A ideia por trás desse modelo é simples: calcular os custos de produção e, em seguida, aplicar um percentual sobre esses custos para garantir uma margem de lucro satisfatória. Embora essa estratégia pareça prática e até atraente à primeira vista, ela falha em diversos aspectos cruciais, como flexibilidade, percepção de valor e adaptação ao mercado.

O principal problema da precificação por markup é a dificuldade de determinar o custo unitário de forma precisa. Como os custos variáveis podem mudar com o volume de produção, muitas vezes as empresas acabam aplicando um preço que não corresponde ao valor real que o consumidor está disposto a pagar. Além disso, essa estratégia ignora a elasticidade-preço da demanda e os fatores externos que afetam o mercado, como as ações dos concorrentes e o comportamento do consumidor. Isso pode resultar em preços excessivos para um mercado mais sensível, ou preços muito baixos para um produto premium, que poderia ser vendido por um valor mais alto.

A utilização do markup não leva em consideração as variáveis comportamentais e de mercado que afetam diretamente a percepção de valor do produto. Em mercados de competição monopolística, onde se tem uma grande competitividade mas ainda assim com atores assumindo o papel de formadores de preço (e não tomadores), os consumidores estão cada vez mais informados e sensíveis ao preço, essa abordagem pode se tornar um grande obstáculo, prejudicando tanto a percepção de qualidade quanto a margem de lucro. O que deveria ser uma ferramenta estratégica para garantir o retorno do investimento se torna uma armadilha, que, ao não levar em conta a dinâmica do mercado, pode expurgar o cliente ou, até mesmo, provocar a perda de vendas.

Como vimos, essa ferramenta mais simplista detem varios problemas, dentre eles a analise do consumidor. Então a resposta seria precificar de acordo com o comportamento do meu cliente? É o que vamos averiguar.

03.2 – Precificação Orientada pelo Cliente (Customer-Driven Pricing)

A precificação orientada pelo cliente, ou customer-driven pricing, é uma abordagem que busca determinar os preços com base na percepção de valor do consumidor, levando em consideração o quanto ele está disposto a pagar pelo produto ou serviço. A base dessa teoria nos traz um conceito muito relevante da microeconomia, que é o “Excedente de Consumo”. Valeria a pena um artigo só para adentrarmos nesse tópico, mas, em suma, estamos falando de uma margem entre o máximo valor que um cliente está disposto a pagar e o seu preço real. Sendo uma diferença positiva, gerará satisfação e engajamento, segundo a teoria econômica. Ou, ao contrário, com um saldo negativo, o consumidor sairá insatisfeito ou não efetuará a compra. Em teoria, essa estratégia parece ideal, pois reconhece que o preço não deve ser apenas uma função dos custos de produção ou do preço dos concorrentes, mas sim do valor subjetivo atribuído ao produto pelos clientes. No entanto, apesar de sua aparente sensatez, essa abordagem também possui falhas que podem comprometer a rentabilidade e o crescimento sustentável de uma empresa.

O principal problema da precificação orientada pelo cliente é que ela pode levar as empresas a adotarem preços excessivamente baixos em um esforço para agradar o maior número possível de consumidores. Ao tentar atender a diferentes segmentos de mercado e atender ao que o cliente “está disposto a pagar”, a empresa pode acabar deixando de capturar o valor total que seus produtos oferecem. Essa abordagem, se não for bem administrada, pode resultar em preços que não cobrem adequadamente os custos, diminuindo a margem de lucro e prejudicando a viabilidade financeira do negócio.

Além disso, o conceito de “disposição a pagar” é altamente variável e nem sempre é fácil de mensurar com precisão. O comportamento do consumidor não é linear e pode ser influenciado por diversos fatores externos, como emoções, contexto econômico e até mesmo influências sociais. Isso torna a precificação orientada pelo cliente uma tarefa difícil de aplicar de maneira consistente e eficaz. O risco de um erro estratégico é grande, especialmente em mercados saturados ou altamente competitivos, onde os consumidores são muito sensíveis ao preço.

Portanto, embora a precificação orientada pelo cliente seja uma abordagem que busca capturar o máximo de valor do consumidor, ela também pode levar a uma subvalorização do produto, comprometendo as margens de lucro e criando uma percepção de baixa qualidade. Em mercados onde os consumidores buscam constantemente o menor preço possível, essa estratégia pode resultar em uma “corrida para o fundo do poço”, onde a empresa não consegue se diferenciar e nem alcançar os lucros necessários para sustentar seu crescimento. Se não é os custos nem meu cliente, devo então me voltar ao mercado? No próximo tópico, discutiremos como a precificação orientada pelo mercado pode fornecer uma alternativa mais equilibrada para capturar valor, respeitando as dinâmicas competitivas e as expectativas do consumidor.

03.3 – Precificação Orientada por Mercado (Share-Driven Pricing)

A precificação orientada por mercado, ou share-driven pricing, é uma estratégia onde as decisões de preço são amplamente influenciadas pelos preços dos concorrentes. Nesse modelo, as empresas ajustam seus preços em função daquilo que é praticado no mercado, com o objetivo de obter uma fatia maior de participação de mercado. A ideia central por trás dessa abordagem é que o aumento da participação de mercado pode resultar em maiores economias de escala, redução de custos unitários e, eventualmente, maior lucratividade. Embora essa teoria pareça plausível, a prática demonstra que a adoção dessa estratégia pode ser prejudicial para as finanças e a estratégia de longo prazo de uma empresa.

O problema fundamental da precificação orientada por mercado é que ela tende a desconsiderar a realidade econômica da empresa e, frequentemente, ignora os diferenciais de valor que o produto oferece em relação aos concorrentes. Ao simplesmente ajustar os preços para competir com os concorrentes, uma empresa pode acabar entrando em uma guerra de preços, onde o único fator determinante para o consumidor será o preço, sem considerar outros aspectos do produto, como qualidade, inovação ou serviço. Além disso, um bom gestor de marketing também terá consciência das estratégias de expansão e defesa de mercado, nas quais concorrentes podem reduzir os preços como uma tática para forçar sua empresa a fazer o mesmo, comprimindo suas margens de lucro — uma espécie de ataque ao flanco. Isso pode levar a uma erosão das margens de lucro, tornando a empresa dependente de estratégias de preços agressivas que, a longo prazo, são insustentáveis.

Além disso, a precificação orientada por mercado pode resultar em um comportamento reativo, em vez de uma abordagem estratégica. Em mercados altamente competitivos, a simples imitação dos preços dos concorrentes pode colocar a empresa em uma posição vulnerável, especialmente se os concorrentes adotarem preços abaixo do custo ou praticarem uma política de “penetration pricing” (preço de penetração), com o intuito de ganhar participação de mercado de forma agressiva. Nesse contexto, as margens de lucro ficam comprimidas e a capacidade da empresa de gerar valor através de diferenciação é limitada.

Outro risco da estratégia orientada por mercado é a falta de controle sobre a percepção de valor do consumidor. Quando uma empresa se alinha demais com os preços de mercado, ela corre o risco de ser vista como uma opção genérica, sem diferenciação clara, o que pode prejudicar a construção de uma marca forte e bem posicionada. Embora a competitividade de preços seja importante, a dependência excessiva dessa abordagem pode enfraquecer a proposta de valor da empresa e limitar suas oportunidades de crescimento sustentável. Ao invés de seguir cegamente os preços do mercado, as empresas devem avaliar constantemente suas capacidades de diferenciação, entender o valor que entregam aos seus consumidores e construir um modelo de precificação que reflita não apenas a concorrência, mas também os custos reais e a percepção de valor.

03.4 – Precificação para Economistas

A precificação para economistas, baseada na teoria econômica clássica, propõe que o preço de um produto deve ser determinado pela interação entre as curvas de demanda e preço, sua respectiva elasticidade e os níveis ótimos de maximização de lucros por meio da análise marginal (Custo Marginal). A princípio, essa abordagem parece racional e eficiente, especialmente ao considerar as fórmulas da elasticidade-preço da demanda e da curva de demanda. E realmente é! A elasticidade-preço da demanda mede o grau de sensibilidade da quantidade demandada frente a variações no preço. Quando a demanda é elástica, uma pequena alteração no preço resulta em uma variação proporcionalmente maior na quantidade demandada, indicando elevada responsividade do consumidor. Por outro lado, uma demanda inelástica reflete pouca variação na quantidade demandada diante de mudanças no preço, característica típica de bens considerados necessários ou com poucos substitutos próximos. A elasticidade da demanda, portanto, não é determinada por um único fator, mas resulta da interação entre diversos elementos, como a disponibilidade de substitutos, a natureza do bem (necessário ou supérfluo), a definição do mercado e o horizonte temporal considerado. Complexo né, você não viu nada.

Por isso, na prática, apesar de ser um otimo caminho, a implementação da precificação baseada exclusivamente em modelos econômicos e na teoria das curvas de demanda se revela altamente desafiadora. Isso ocorre porque, no mundo real, a demanda por um produto não é fixa ou facilmente mensurável. A interação entre preço, demanda e outros fatores, como percepção do valor pelo consumidor e o contexto de mercado, torna a formulação de uma estratégia de preços baseada na teoria econômica extremamente complexa e imprecisa. Além disso, fatores como o comportamento do consumidor, a disponibilidade de informações sobre alternativas e a percepção de valor do produto complicam ainda mais a tarefa de aplicar a teoria econômica de forma eficaz.

Embora a utilização de conceitos como a elasticidade-preço da demanda seja válida em muitos contextos, a dificuldade de medir e prever com precisão esses parâmetros no mundo real limita sua aplicabilidade. A elasticidade de demanda pode variar ao longo do tempo e entre diferentes segmentos de consumidores, o que torna a precificação dinâmica uma tarefa desafiadora. A tentativa de otimizar preços com base na teoria econômica, sem considerar as nuances do mercado real, pode levar a decisões de precificação erradas e a um risco elevado de subvalorizar ou supervalorizar produtos, resultando em margens de lucro insustentáveis e perda de competitividade.

A abordagem puramente econômica da precificação tende a ignorar fatores subjetivos importantes, como a experiência do cliente, o valor percebido e as variáveis psicológicas que influenciam as decisões de compra. Por exemplo, um aumento no preço de um produto não pode ser avaliado apenas com base na curva de demanda; é essencial considerar como os consumidores percebem esse aumento em relação ao valor agregado, a lealdade à marca e as alternativas disponíveis no mercado. Essa falha em incorporar fatores comportamentais leva à limitação de uma abordagem de precificação puramente econômica, a qual precisa ser integrada com uma visão mais holística de valor e diferenciação para alcançar os resultados desejados.

Portanto, embora a teoria econômica forneça uma base útil para a compreensão dos preços em mercados teóricos, a aplicação prática dessas ideias exige uma adaptação para considerar a complexidade do comportamento do consumidor e as condições dinâmicas do mercado. Nas próximas seções, discutiremos como uma abordagem mais estratégica e holística de precificação pode superar as limitações da precificação puramente econômica, com foco na criação e comunicação de valor.

04 – As 06 etapas de Kotler para Precificação

Philip Kotler, em sua brilhante obra Administração de Marketing, apresenta um modelo robusto e sistemático para a definição de preços, que abrange seis etapas essenciais. Este framework busca assegurar que a precificação não seja apenas uma resposta mecânica a custos e concorrência, mas uma estratégia alinhada aos objetivos de longo prazo da empresa e às necessidades do consumidor. A seguir, são discutidas cada uma dessas etapas e sua relevância no processo de precificação estratégico.

A primeira etapa é a Seleção do Objetivo da Determinação de Preços. Aqui, a empresa deve definir claramente o que deseja alcançar com sua estratégia de preços. Os objetivos podem variar desde a sobrevivência da empresa, especialmente em momentos de crise, até a maximização do lucro ou da participação de mercado. O objetivo escolhido guiará todas as decisões subsequentes, ajudando a determinar o posicionamento do produto no mercado.

A segunda etapa, Determinação da Demanda, consiste em entender a relação entre preço e volume de vendas. O preço a ser definido não pode ser tomado isoladamente, pois depende diretamente da elasticidade da demanda – isto é, como a quantidade demandada muda quando o preço é alterado. Para isso, é essencial avaliar a sensibilidade do consumidor ao preço e o comportamento de compra em diferentes níveis de preços. As empresas podem utilizar pesquisas de mercado, experimentos de preço e análise de histórico de vendas para estimar essa demanda.

A terceira etapa, Estimativa de Custos, requer que a empresa calcule os custos totais envolvidos na produção e venda do produto ou serviço. Isso inclui custos fixos e variáveis, além de outras despesas associadas ao marketing, distribuição e serviços pós-venda. A definição de preço deve, pelo menos, cobrir esses custos, mas também deve considerar a margem de lucro desejada. A compreensão dos custos é fundamental para garantir que a empresa não sofra prejuízos.

A quarta etapa, Análise de Custos, Preços e Ofertas dos Concorrentes, exige que a empresa avalie o mercado competitivo. Isso inclui uma análise detalhada dos preços praticados pelos concorrentes, as características de seus produtos e como os consumidores percebem essas ofertas. A comparação com a concorrência ajuda a posicionar o preço de maneira estratégica, levando em consideração tanto o custo relativo quanto o valor percebido do produto ou serviço.

A quinta etapa é a Seleção de um Método de Determinação de Preços. Com base nas etapas anteriores, a empresa escolhe o método que mais se adequa aos seus objetivos e ao mercado em que atua. Entre os métodos mais comuns estão a precificação baseada em custos (markup pricing), em valor percebido, em valor ideal ou até mesmo a estratégia de penetração de mercado. Cada método traz diferentes implicações em termos de posicionamento de preço e percepção do consumidor.

Por fim, a sexta etapa, Seleção do Preço Final, envolve a decisão do valor exato a ser cobrado pelo produto ou serviço. Nessa etapa, a empresa já deve ter uma compreensão clara dos custos, da demanda, da concorrência e dos objetivos estratégicos. O preço final deve ser compatível com a estratégia de longo prazo da empresa, respeitando a percepção de valor do consumidor e mantendo uma margem de lucro adequada.

Essas seis etapas de Kotler oferecem uma abordagem estruturada e abrangente para a definição de preços. Contudo, é importante destacar que a precificação deve ser um processo dinâmico, adaptando-se às mudanças no mercado, nas preferências do consumidor e nas condições econômicas. A seguir, abordaremos a estratégia da Cascata de Nagle, que complementa esse modelo com um enfoque mais detalhado na comunicação e captura de valor, essencial para uma precificação estratégica eficaz.

05 – Tese da Cascata de Nagle

A abordagem de Thomas T. Nagle sobre precificação, conhecida como a Cascata de Valor (Value Cascade), oferece uma perspectiva sofisticada e estratégica sobre como as empresas podem estabelecer preços que não apenas cobrem custos e maximizam lucros, mas também criam e comunicam valor de maneira eficaz para diferentes segmentos de clientes. A teoria de Nagle se desvia das abordagens tradicionais, como a precificação baseada em markup ou na concorrência, ao enfatizar uma perspectiva mais holística e integrada de como a percepção de valor se relaciona com o preço ao longo de várias etapas do processo de precificação. A Cascata de Valor propõe uma sequência de seis etapas que buscam garantir que a precificação seja feita de forma coerente, otimizando o retorno e a competitividade da empresa, sem comprometer o valor percebido pelo cliente.

05.1Value Creation Gap (Gap de Criação de Valor)

A primeira etapa da Cascata de Valor se concentra na criação do valor em si. Nagle argumenta que, para que um preço seja eficaz, a empresa precisa, primeiramente, criar um valor genuíno para o cliente, que seja percebido como superior a alternativas competitivas. O primeiro desafio da empresa é entender quais são os benefícios que os consumidores realmente buscam e como ela pode entregar esses benefícios de forma diferenciada. A criação de valor está intimamente ligada à capacidade da empresa de inovar, melhorar seus produtos ou serviços, e de proporcionar uma experiência que seja percebida como superior ou única. Este valor pode ser gerado por meio de características como a qualidade do produto, a inovação tecnológica, a confiabilidade, o atendimento ao cliente, ou qualquer outro fator que agregue benefícios exclusivos ao consumidor.

Para entender e capturar esse valor, as empresas devem ser capazes de analisar e quantificar as preferências do consumidor, utilizando ferramentas como pesquisas de mercado, análise de comportamento do consumidor, e inteligência competitiva. A criação de valor, nesse contexto, não se resume a simplesmente melhorar o produto ou reduzir custos; envolve uma visão estratégica mais ampla que inclui entender a necessidade do mercado, as expectativas dos consumidores, e como as ofertas da empresa podem se alinhar a esses fatores de forma única.

05.2Value Communication Gap (Gap de Comunicação de Valor)

Após a criação do valor, o próximo passo da Cascata de Valor é a comunicação eficaz desse valor para o consumidor. Nagle destaca que, muitas vezes, as empresas falham em comunicar o valor de seus produtos ou serviços de maneira que o cliente perceba claramente os benefícios que ele está recebendo. A comunicação de valor envolve a tradução das vantagens do produto para uma linguagem que ressoe com as necessidades e expectativas do consumidor. Isso pode ser feito por meio de marketing direto, publicidade, promoções, e outras formas de comunicação.

Uma falha comum na comunicação de valor é a tentativa de focar em características do produto que não são valorizadas pelo consumidor. O produto pode ter inovações tecnológicas ou recursos adicionais que a empresa acredita serem valiosos, mas que, para o cliente, podem ser irrelevantes. A chave para uma comunicação eficaz é identificar os pontos de diferenciação que realmente importam para o cliente e garantir que esses pontos sejam destacados na comunicação.

A comunicação de valor também inclui a gestão de expectativas. A forma como a empresa comunica o preço e os benefícios de sua oferta pode alterar significativamente a percepção do valor pelo consumidor. Por exemplo, o uso de mensagens que enfatizem a qualidade, a durabilidade ou o suporte ao cliente pode justificar um preço mais alto. Empresas como Apple são mestres nessa comunicação, criando uma percepção de valor premium que permite que seus produtos sejam vendidos a preços mais elevados, devido ao valor emocional e funcional agregado à experiência de compra.

05.3Price Structure Gap (Gap de Estrutura de Preço)

O terceiro componente da Cascata de Valor envolve a definição da estrutura de preços. A estrutura de preços é a maneira como a empresa organiza seus preços de acordo com os diferentes segmentos de clientes, canais de distribuição, e variações de produto. Em mercados complexos, como o de serviços ou produtos diferenciados, a estrutura de preços pode incluir diferentes pacotes, versões do produto ou ofertas de preços personalizados que atendem a diversas necessidades e percepções de valor entre os consumidores.

Aqui, Nagle introduz a ideia de segmentação de mercado e como uma estrutura de preços bem elaborada pode maximizar o valor percebido por diferentes grupos de consumidores. Isso pode incluir, por exemplo, preços diferenciados por características do produto (como uma versão básica, intermediária e premium), preços por uso, ou até mesmo preços baseados em assinatura, como vemos em plataformas de streaming.

Ao definir uma estrutura de preços, a empresa deve considerar as diferenças nas necessidades e disposições para pagar entre seus diversos segmentos de consumidores. Um bom exemplo disso é a indústria de aviação, onde as empresas aplicam preços diferenciados para classes como econômica, executiva e primeira classe, atendendo a diferentes perfis de consumidores e suas respectivas percepções de valor.

05.4Price Policy Gap (Gap de Política de Preço)

A Cascata de Valor também implica a necessidade de uma política de preço clara e bem definida. A política de preços é um conjunto de diretrizes internas que orienta como os preços serão ajustados com base em variáveis externas e internas. Essas diretrizes envolvem questões como descontos, promoções, condições de pagamento, e ajustes de preço com base em fatores como demanda, custos e concorrência.

Uma política de preço eficaz deve alinhar-se com os objetivos estratégicos da empresa. Por exemplo, uma política de preço de penetração visa maximizar a participação de mercado, enquanto uma política de preço de desnatamento visa maximizar os lucros a curto prazo, cobrando preços mais elevados inicialmente e depois ajustando-os à medida que o mercado se adapta.

Essa etapa também implica a necessidade de controlar os descontos, pois a aplicação indiscriminada de descontos pode minar a percepção de valor do produto e prejudicar a margem de lucro. Empresas como a IKEA, que mantêm uma política de preços consistentemente baixos, são exemplos de como uma política de preços bem estruturada pode consolidar a imagem de uma marca e atrair consumidores em busca de valor.

05.5Price Setting Gap (Gap de Determinação de Preço)

Na quinta etapa, o preço final é determinado, levando em consideração as várias influências do mercado e da empresa. Nagle observa que, embora as empresas possam calcular preços com base em custos e valor percebido, o preço final muitas vezes precisa ser ajustado com base em considerações de mercado, como a resposta dos concorrentes e a dinâmica da demanda.

O processo de determinação de preço deve ser dinâmico, com a empresa ajustando os preços à medida que as condições do mercado mudam. Uma empresa pode, por exemplo, lançar um produto a um preço mais baixo inicialmente, para depois aumentar o preço à medida que a demanda cresce e o produto ganha popularidade. No entanto, essa abordagem requer uma gestão cuidadosa para evitar reações negativas dos consumidores ou perda de competitividade.

05.6Price Competition Gap (Gap de Competição de Preço)

O último estágio da Cascata de Valor lida com a reação da concorrência. Em mercados altamente competitivos, a concorrência de preços pode ser um fator crucial. Nagle observa que, em mercados oligopolistas ou saturados, a competição de preços pode forçar as empresas a ajustar seus preços para manter ou aumentar sua participação de mercado. Porém, uma guerra de preços pode ser prejudicial a longo prazo, pois pode levar à erosão das margens de lucro e prejudicar a percepção de valor do produto.

Para gerenciar a competição de preços de forma eficaz, Nagle sugere que as empresas devem estar preparadas para tomar decisões estratégicas, como a diferenciação de produto, a introdução de novos recursos, e a criação de barreiras competitivas. Empresas como Apple, por exemplo, não entram em guerras de preços, pois se concentram na diferenciação de seus produtos e na criação de uma experiência de marca única, permitindo-lhes cobrar preços premium sem perder clientes para a concorrência.

06Conclusão

A precificação estratégica é uma das decisões mais poderosas que uma empresa pode tomar, pois não se trata apenas de cobrir custos ou ajustar preços para competir no mercado. Ela envolve a criação de valor, a comunicação desse valor de maneira eficaz e a maximização do lucro de forma inteligente e sustentada. No entanto, como vimos ao longo deste artigo, as práticas de precificação equivocadas, como o “Cost-Plus Pricing”, “Customer-Driven Pricing” e “Share-Driven Pricing”, podem levar a resultados prejudiciais e gerar distorções no valor percebido pelo consumidor.

Apesar das dificuldades práticas em adotar modelos econômicos de precificação, como a análise de curvas de demanda e elasticidade, os conceitos defendidos por Kotler e Nagle são fundamentais para orientar uma política de preços mais eficiente e adaptada às realidades de cada mercado. As etapas de precificação delineadas por Kotler e a estratégia de cascata de Nagle proporcionam uma abordagem mais robusta e focada no valor, permitindo que as empresas posicionem seus produtos de maneira competitiva, ao mesmo tempo que garantem margens adequadas e uma percepção de valor que fideliza seus consumidores.

A precificação não é apenas uma questão de número; ela é uma ferramenta de diferenciação estratégica. Quando bem feita, ela pode se tornar o diferencial competitivo de uma empresa, atraindo consumidores, criando lealdade e, acima de tudo, garantindo a sustentabilidade do negócio no longo prazo. As empresas que abraçam uma abordagem estratégica de precificação estão não apenas ajustando preços, mas criando um mercado em que seu produto ou serviço se destaca pela percepção de valor superior, tornando-se a escolha preferida dos consumidores.

Portanto, é imperativo que os gestores entendam que a precificação vai além de um simples cálculo. Ela deve estar intimamente alinhada à estratégia de marketing, ao entendimento do comportamento do consumidor e à visão de longo prazo da empresa. A aplicação dessas abordagens não apenas otimiza as receitas e lucros, mas também constrói uma base sólida para o crescimento sustentável e o fortalecimento da marca.